Homens Brancos Não Sabem Blogar

Arquivo : james naismith

Dois cestos de pêssego e uma bola de futebol
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naismith

(Springfield, 1891) James Naismith estava em maus lençóis. Ele havia acabado de assumir o comando de um grupo de 18 homens da YMCA – que mais tarde viria a se tornar uma música do Village People, mas que na verdade significa Young Men’s Christian Association, a Associação Cristã de Moços. Essas escolas normalmente serviam como uma opção à vida nas ruas para jovens em busca de trabalho, incentivando a prática de princípios cristãos através de estudos bíblicos e orações. Acontece que era inverno e Springfield é uma cidade super fria, no nordeste dos Estados Unidos, na mesma linha de Boston, e – na época – os esportes que existiam eram quase todos jogados ao ar livre: rugby, futebol, baseball, etc. Em outras palavras, a turma de 18 homens estava puta: a grande maioria desempregada, boa parte longe de casa, frio pra cacete, sem poder praticar esporte, tava impossível de aguentar e a galera tava saindo na mão o tempo todo.

O diretor da escola então contratou Naismith e pediu para ele criar um esporte indoor que pudesse servir de distração pra essa turma. As exigências do diretor eram que o esporte não tomasse muito espaço, fosse possível de ser aprendido rapidamente, fizesse com que os alunos entrassem em forma e – obrigatoriamente – não fosse violento. Detalhe: Naismith tinha o prazo de 14 dias para cumprir essa tarefa. Como eu disse, ele estava em maus lençóis.

Para começar a criar o novo jogo, Naismith eliminou de cara qualquer coisa que dificultasse o aprendizado do esporte. Os alunos teriam pouco tempo para aprendê-lo. Então não poderia haver tacos, raquetes, nada que se intrometesse entre o atleta e o objeto que está em jogo. Em segundo, ele pensou que todo grande jogo tem que ter uma bola e resolveu que no dele haveria uma bola também. Resolveu ainda que os atletas jogariam com a mão porque com o pé seria mais difícil aprender. Por último, sobrou o mais complicado: ele tinha que pensar nas situações que faziam com que os esportes populares da época fossem violentos.

O Rugby era violento porque havia tackles. E havia tackles porque os jogadores precisavam ser parados. Os jogadores precisavam ser parados porque… porque eles correm com a bola! No novo jogo, então, correr com a bola não seria permitido. O atleta teria que ou arremessá-la ou passá-la. Isso já resolveria boa parte dos problemas. E, é claro, os punhos não poderiam ser utilizados para encostar na bola, muito menos os pés, apenas a palma das mãos.
Ele também concluiu que uma bola grande, leve e macia como a do futebol seria a mais segura.

Por fim, Naismith garantiu uma redução grande no contato ao fazer com que o objetivo do jogo estivesse acima dos defensores e, portanto, impossível de ser defendido. Ele imaginou também que os atacantes teriam que lançar a bola para cima com precisão e não com força, diminuindo a possibilidade de um jogador acertar o outro com a bola.

Com isso em mente e treze regras básicas escritas, doze dias depois de ter aceitado o desafio, em Dezembro de 1891, o primeiro jogo de um novo esporte aconteceu. Todos os 18 alunos jogaram, 9 de cada lado. Três na defesa, eram os guardas, três no centro, eram os centrais, e três no ataque, eram os avançados. Naismith não havia achado duas caixas para pendurar nas paredes e acabou pendurando duas cestas para coletar pêssegos. A partida teve muitas faltas: os garotos corriam muito com a bola, havia tackles e chutes e socos. Em pouco tempo, tornou-se um salve-se quem puder. Havia olhos roxos por todos os lados, um rapaz deslocou o ombro e mais adiante um menino ficou inconsciente. Mas esse era só o começo. Quando a regra de não poder correr com a bola ficou clara e foi obedecida, tudo mudou. Foi um verdadeiro sucesso. Cada vez mais pessoas se interessavam pelo jogo. Os rapazes brigavam menos. Naismith havia conseguido.

Dois anos depois, em 1893, o esporte havia se tornado tão popular que já era conhecido internacionalmente e, em menos de 15 anos, o basquete apareceria pela primeira vez nas olimpíadas. Da nossa parte, fica um muito obrigado ao Dr. James Naismith, ao rapazes que se arrebentavam na porrada no inverno de 1891 e ao frio maldito de Springfield.

Este conteúdo foi originalmente produzido para o quadro ‘Bola ao Cesto’ do Estação Basquete, podcast semanal do Homens Brancos não Sabem Blogar em parceria com a Central3. Vamos ao ar todas as segundas-feiras, ao vivo, às 21h. A história utilizou informações do livro “Basketball. Its origin and development” de James Naismith. Na foto, Smith e sua esposa, Maude Sherman, em 1928.


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